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O Tema 1046 de Repercussão Geral no STF e as Horas Extraordinárias dos Bancários

Inicialmente, faz-se importante deixar claro que o autor desse artigo se mostra contrário às recentes alterações legislativas na área trabalhista, em especial as da Reforma Trabalhista, pois, notadamente inconstitucionais.

Ora, é expressamente vedado o retrocesso social, em tese o que deveria se garantir era a proteção de um patamar civilizatório mínimo, com o aumento de direitos sociais, de proteção ao trabalho humano, como era preconizado pela principiologia trabalhista.

Porém, causa espécie que os julgadores trabalhistas estivessem tão afoitos para julgar em prejuízo do trabalhador, mesmo que em tese tenham uma formação humanística diferenciada, haja vista que escolheram a Magistratura do Trabalho, uma atividade nobre e que deve, sim, proteger o trabalhador.

Infelizmente, se essa se tornou a realidade nos juízos especializados, não surpreende o caminho tomado no Tema 1046 de Repercussão Geral do Supremo Tribunal Federal. Este mesmo Tribunal que altera posicionamentos conforme a política do momento, que é afirma que a democracia está em perigo, mas ao mesmo tempo prende empresários por posicionamentos em Grupos de WhatsApp, decidiu pela prevalência do negociado sobre o legislado no julgamento desse tema.

Conforme a certidão de julgamento, foi fixada a seguinte tese:

“O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 1.046 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário, nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Edson Fachin e Rosa Weber. Em seguida, por unanimidade, foi fixada a seguinte tese: “São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis”. Ausentes, justificadamente, o Ministro Luiz Fux (Presidente), impedido neste julgamento, e o Ministro Ricardo Lewandowski. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber, Vice-Presidente. Plenário, 2.6.2022” (Grifei)

Esse singelo artigo não pretende se alongar sobre o tema, mas é necessário ressaltar que após a inconstitucional Reforma Trabalhista, os Sindicatos restaram fragilizados, portanto, até mesmo sua capacidade de negociar de “igual para igual” deveria ser contestada – esse foi um dos argumentos do Supremo.

Todavia, o que nos traz ao debate é a situação dos bancários.

A Convenção Coletiva do Trabalho de 2018/2020, traz no Parágrafo Primeiro, da Cláusula 11º, uma absurda compensação da gratificação de função pelas horas extras na hipótese de juízo afastar o enquadramento do cargo de confiança previsto no artigo 224, § 2º da CLT, contrariando não só o entendimento consolidado da Súmula nº 109 do TST como também o princípio constitucional da vedação do retrocesso social, bem como tem como finalidade secundária limitar o poder jurisdicional do Estado.

Vejamos:

CLÁUSULA 11 – GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO

O valor da gratificação de função, de que trata o § 2º do artigo 224, da Consolidação das Leis do trabalho, não será inferior a 55% (cinquenta e cinco por cento), à exceção do Estado do Rio Grande do Sul, cujo percentual é de 50% (cinquenta por cento), sempre incidente sobre o salário do cargo efetivo acrescido do adicional por tempo de serviço, já reajustados nos termos da cláusula primeira, respeitados os critérios mais vantajosos e as demais disposições específicas previstas nas Convenções Coletivas de Trabalho Aditivas.

Parágrafo primeiro – Havendo decisão judicial que afaste o enquadramento de empregado no trabalho prestado além da 6ª (sexta) hora diária, de modo que a jornada somente é considerada extraordinária após a 8ª (oitava) hora trabalhada, o valor devido relativo às horas extras e reflexos será integralmente deduzido/compensado, com o valor da gratificação de função e reflexos pagos ao empregado. A dedução/compensação prevista neste parágrafo será aplicável às ações ajuizadas a partir de 1º.12.2018.

Parágrafo segundo – A dedução/compensação prevista no parágrafo acima deverá observar os seguintes requisitos, cumulativamente:

a)           será limitada aos meses de competência em que foram deferidas as horas extras e nos quais tenha havido o pagamento da gratificação prevista nesta cláusula; e

b)           o valor a ser deduzido/compensado não poderá ser superior ao auferido pelo empregado, limitado aos percentuais de 55% (cinquenta e cinco por cento) e 50% (cinquenta por cento), mencionados no caput, de modo que não pode haver saldo negativo.”

Referida clausula beira a piada de mal gosto. Se por um lado a previsão está eivada de vícios legais, seja pela vedação ao retrocesso social, seja porque referido negócio jurídico seria nulo, seja porque no Código Civil a previsão de Compensação deveria ser por algum débito em comum entre as partes e na relação de trabalho inexiste débito entre trabalhador e empregador.

Por outro lado, ou seja, além dos vícios, há uma clara tentativa de esvaziar a prestação jurisdicional, ou seja: caso o juízo decida pelas horas extras, o deferimento seria vazio, tratando-se de uma espécie de “cláusula-chantagem-condicional”.

Assim, importante registrar o posicionamento de que, mesmo com o julgamento do Tema 1046 do STF, não deve ser autorizada a interpretação de que aquela cláusula negociada deva valer, pois em confronto com princípios constitucionais mais amplos, bem como em notória ilegalidade ante a legislação comum.

Porém, com o judiciário como se encontra, não causará surpresa que os juízes de primeiro grau aceitem a cláusula sem qualquer juízo de valor, apenas porque é mais fácil do que ter que ir contra a maré e defender o trabalhador.

*Rodrigo Ungaretti Tavares, advogado trabalhista,

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